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O processo de divórcio foi muito doloroso. Não poderia ser diferente, considerando o tumultuado final de uma década de comunhão de vida. Ambos tinham, um ao outro, como primeiros namorados. Um casamento qualificado como perfeito, sendo que o filho, fruto de um planejamento consensual, parecia ser o corolário dessa união.
Não foi assim. Desde o nascimento da criança, as dificuldades para a adaptação da nova composição familiar foram difíceis. A mãe assumiu para si toda a responsabilidade pela sua educação, dispensando a participação do pai, que se acomodou a tal situação, reproduzindo-se assim uma cultura milenar.
Quando o menino completou seis anos, a relação conjugal já se encontrava totalmente deteriorada e o surgimento de um novo relacionamento na vida do homem foi o gatilho para o divórcio.
Por absoluta falta de confiança em deixar a criança com o pai, alegando a total inexperiência nos seus cuidados, a mãe lutou até o último momento pela guarda unilateral. Foi inútil. A sentença final decidiu pela forma compartilhada, determinando a convivência parental semanal.
Durante um ano a mulher conseguiu obstaculizar esse convívio das mais variadas formas, restando ao pai o ajuizamento de uma ação alegando a alienação parental. O julgador determinou a entrega da criança, sob pena da reversão da guarda, e o primeiro período definido para essa convivência foi o da festa natalina.
Na manhã da véspera do Natal, a mãe percebeu que a criança estava febril, mas receosa de que fosse cumprida a penalidade imposta na decisão judicial, deixou que o pai a levasse sem informar o que havia constatado. No meio da noite, seu telefone tocou. No visor a indicação "Pai de meu filho".
Há muito tempo, aquele que anteriormente era indicado na agenda como "Amor", não fazia uma ligação. No máximo, a comunicação ocorria através de mensagens escritas, curtas e secas.
A mulher, então, sentiu a gravidade da situação e, em desespero, ouviu a notícia da hospitalização emergencial do menino. Sem pensar em mais nada, deslocou- se para o hospital indicado e lá recebe a notícia de que a criança já se encontrava na sala de cirurgia.
Sozinha e em completo desespero, procura abrigo na pequena capela existente no local. Cai de joelhos em frente ao pequeno e simples presépio e se põe a rezar. Sente então uma presença forte ao seu lado e, mesmo sem olhar, sabe que ali está o pai de seu filho. Seu antigo e primeiro amor.
A madrugada avança e quando os primeiros raios de sol atravessam os vitrais coloridos, surge na porta a auxiliar de enfermagem. Vinha à procura dos pais do pequeno enfermo e traz boas notícias. Ao ver aquele casal que se encontra em oração com as mãos entrelaçadas em frente ao pequeno presépio, para e aguarda em silêncio.
Na pequena manjedoura improvisada, o recém-nascido, com os bracinhos erguidos para o alto, parece sorrir e abençoar. Os sinos da pequena capela badalam fortemente, saudando o dia de Natal que começa trazendo a esperança de um novo e melhor tempo.